quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Movimentos cívicos

As marchas de protesto são ótimas para aliviar a consciência. A malta combina uma hora e lá aparece com cartazes às costas, dá uma volta pela baixa da cidade, fica com a sensação de dever cumprido, uma história para contar e à ida para casa aproveita para comprar frango assado para o jantar. No fundo, no fundo, é a expressão máxima do portuguesíssimo "agarrem-me senão eu mato-o". Estão todos ali a "agarrar-se" uns aos outros e gritam  frases feitas, enquanto olham para o lado ao estilo "Viste o que eu disse? É para aprenderem. Em 74 eu...".

Estas manifestações lembram-me as reportagens sobre acidentes no estrangeiro. Cai um avião no Chade e os jornalistas centram a notícia em "ainda não está confirmado se há alguma vítima portuguesa". Eventualmente lá encontram um tipo que estava a atravessar a fronteira do Níger para o Chade que, quase ameaçado de porrada pelo jornalista, sempre diz "sim, eu tenho um primo que no ano passado viajou num avião parecido com aquele". Este domingo foi mais ou menos isto. Foi a nossa primavera islâmica (já quase no outono, porque cá o que interessa é participar). A malta também veio para a rua. Enganou-se foi no destinatário, porque para ser a sério, tinham de desatar à estalada uns aos outros.

Por mim, isto só é consequente se cada um de nós passar a ser um movimento cívico em marcha permanente. Um movimento cívico unipessoal, que em vez de reclamar contra o governo, mete o bedelho naquilo que lhe está ao alcance. Uma espécie de sistema de qualidade total para os serviços públicos.

Vai daí e a título de exemplo: sempre que houver indícios de corrupção ou favorecimento; sempre que num qualquer serviço público apanharmos funcionários em amena cavaqueira enquanto as filas crescem; sempre que um professor se atrasa ou falta sistematicamente; quando num hospital público um médico, enfermeiro ou seja quem for é pouco atencioso; se motoristas de transportes públicos estão parados a aguardar por nada com o autocarro cheio; se imóveis do estado ou equipamento público são tratados de forma negligente por quem os está a manusear; em suma, sempre que as palavras serviço e público estejam juntas e as coisas correm mal, é pedir que os funcionários se identifiquem e chamar o chefe (sendo serviços públicos, há de certeza um chefe, ou dois, ou três). Se a explicação não for satisfatória, segue exposição à tutela exigindo esclarecimentos com prazo de resposta, para dar seriedade à coisa.

Afinal, trata-se de assumir pessoalmente a responsabilidade pelo controlo da forma como o nosso dinheiro é gasto, porque parece que não temos tanto como pensávamos e é capaz de ser boa ideia não o deixar à solta nas mãos de imbecis que o vão estourar em cretinices.

3 comentários:

kiss me disse...

Concordo plenamente.

O problema é que os chefes dessas pessoas também são funcionários públicos.....

Pedro disse...

Que ideia tão pessimista dos funcionários públicos. Este homem todos os dias tem que ter um ódio de estimação. Espero pelo próximo.

RCA disse...

É que é isso mesmo, uma ideia, porque eu não sei o que eles realmente fazem.